terça-feira, 14 de dezembro de 2010
O DESTINO DE POMPÍLIO OU... MA CHÉRIE
Pompílio era muito reprimido pelo pai, alcoólatra inveterado. E assim cresceu. Tímido, mas jogava um bolão com o time varzeano de sua cidade. Por esta qualidade era até respeitado por seus amigos. Por volta dos 14 anos é que as piadinhas começaram. Superada as gozações do vestiário, todos comemoravam a vitória garantida pelos chutes poderosos de Pompílio, como atacante, contra os times adversários. Mas, no final dos jogos, acabava ficando muito só, tendo apenas a compreensão de alguns poucos. E lá ia Pompílio pelas vielas escuras da cidade em busca do amor...O que um garoto sabia da vida lá pelos 17 anos? Imagine as dúvidas, alegrias e dores do amor, para quem provinha de um lar cujos pais viviam em conflito íntimo. Projetava tudo em seu “campeão”, um rapaz do time, com 19 anos e fama de namorador, completamente inacessível, em sua imaginação.
Além do futebol, Pompílio gostava muito de carnaval. Podia liberar um pouco sua timidez.Quando percebeu a enorme carência afetiva que vivia em sua cidade, decidiu mudar de cidade. Aos 20 anos estava vivendo no Rio de Janeiro, com um amigo que conheceu, de passagem, pela sua cidade. Tentou o futebol em vários times. Para sobreviver virou garçon trabalhando em vários bares até chegar, pelos conhecimentos e práticas adquiridos ,a ser barman do Café Nice, na Lapa, que já não guardava mais aquele brilho do passado, quando era reduto frequentado por artistas e boêmios conhecidos como Noel Rosa, Araci de Almeida, as irmãs Linda e Dircinha Batista, Francisco Alves e outros.
Foi aí que conheceu o carnavalesco Joãozinho 30 que estava incrementando a famosa Escola de Samba Beija Flor, de Nilópolis, numa madrugada em que procurava a nostalgia do local há muito tempo perdida, para compor um dos seus famosos temas de carnaval. O convite surgiu, quase por acaso, pois a escola estava precisando de sambistas “e quem sabe você leva jeito...” Joãozinho 30, além de grande amigo,foi seu primeiro professor e grande incentivador . Começou ali sua carreira artística, pois além de sambista revelou seu grande talento como transformista imitando artistas como Carmem Miranda, Elba Ramalho, Marylin Monroe, Sofia Loren,Cher, Gina Lolobrigida, Madonna e outras. Virou uma Drag Queen requisitada para shows em boates, clubes e programas de TV. Ficou famosa. Durante vários carnavais no sambódromo da Marquês de Sapucaí desfilou como uma das estrelas na passarela, na Beija Flor, naqueles primeiros tempos em que a escola era praticamente imbatível, tornando-se campeã entre todas as grandes escolas cariocas.
Um dia, Uma ala da Beija Flor, que se apresentava em shows pelo Brasil, passou por sua cidade. Fazia uns 10 anos que ele não a visitava . Aliás, veio apenas duas vezes quando morreram seus pais. Rapidamente para o enterro de ambos. A apresentação foi num clube da “elite”, numa noite de gala, patrocinada por um empresário conhecido. No elenco estava a Drag Queen Pompílio que agora se chamava Ma Chérie, nome artístico. Além de Joãozinho 30,vários artistas faziam parte da trupe, como o travesti Rogéria,a veterana vedete Virginia Lane, Cauby Peixoto e uns 20 sambistas, homens e mulheres, que levaram os convidados para o show “Noites Cariocas” ao delírio. Todo o elenco ganhou muito dinheiro e todos fizeram seu pé de meia com esses shows.
Quando anunciaram a apresentação de Ma Chérie e suas imitações perfeitas, o apresentador, de uma rádio local, frisou que ele era natural da cidade e que tinha jogado muita bola na infância e adolescência e se chamava Pompílio. O Clube quase veio abaixo. Os aplausos foram contínuos. “ O quê, ele (ou ela) era o filho da dona Genoveva!, meu Deus”, se escandalizavam algumas mulheres. “Olha que pernas, menina! Que voz!”, diziam outras.”Que talento!”, concordavam todos. Os homens ficaram pasmos, no íntimo apaixonados pela grande mudança de uma pessoa. No palco estava uma das grandes estrelas do espetáculo.
Entre eles o “campeão” de Pompílio, na adolescência, que agora , aos 30 anos, era um rico comerciante da cidade. Ficou deslumbrado com a transformação daquele menino tímido do passado. E Ma Chérie deu recado completo como artista. Foi uma grande consagração. Uma espécie de vingancinha contra a cidade. Naturalmente convidou, com o coração batendo forte, durante jantar oferecido pelo clube, aos artistas, para que Ricardo, “O campeão”, fosse visitá-lo, no Rio, ficando em seu belo apartamento, na Barra da Tijuca. “Vou sim, obrigado, ainda sou solteiro, livre e desimpedido”, frisou. “Que bom”, disfarçou Ma Chérie, entre sério e brincalhão.
Diferente do que as más línguas possam mexericar, Pompílio ou Ma Chérie, sempre foi um artista que prezava sua carreira. Nunca foi dado a badalações etílicas. Sempre levou uma vida social simples. Cumpria e ainda cumpre os contratos rigorosamente e continua brilhando nos carnavais cariocas. Aplicou bem o dinheiro que ganhou e ainda ganha com seus shows e pode dar-se ao luxo de parar quando quiser, afirma..Quis o destino que ele e Ricardo se reencontrassem na vida. Vivem juntos até hoje, cada qual cuidando de seus negócios. E ficando muito ricos, cada vez mais ricos.
Atualmente, em férias, devem estar num cruzeiro pelas Ilhas Gregas, ou em qualquer lugar do romântico Mediterrâneo. No Rio, com camisetas da famosa (e cara )grife MA CHÉRIE FOREVER costumam ainda bater uma bola na areia da praia em frente do prédio de apartamentos de alto luxo onde moram, trocando, com todo cuidado, olhares apaixonados.
Moram na cobertura. É claro.
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